Cadeiras amarelas

É uma honra para o PPP publicar o belíssimo texto abaixo, intitulado Cadeiras amarelas.
Escrito pela nova Clarice Lispector, Karen Santana. Exclusivo para o PPP.




Em mais uma de todas aquelas cadeiras desconfortáveis e amarelas, era possível tragar a leveza do lugar.

As mesas pareciam sujas. Os copos, não cheiravam tão bem. O chão era grosso, com a calçada como o apoio. Mas as cervejas vinham geladas e vivas, como quem revelasse os maus bocados da semana de quem a engolia adentro.

Eram cervejas alemãs. Todas elas. E tinham o sabor tão grato, a textura que varria fazendo cócegas na língua, com uma cor que não se podia definir, por conta da falta de iluminação. Mal se podia ver o que lhe vinha no prato ou no richô  que abafava a melodia da gordura sadia.

Rei do joelho, era este o nome do estabelecimento. Famoso entre os que conheciam. Inexistente entre os que eram indiferentes. Mas vivo numa personalidade própria. Comia-se o joelho e a alma do porco! Magnífico.

[...]

E em meio à falta das luzes, aos atendentes que ora fumavam, ora papeavam, à duvidosa limpeza, era ensurdecedora a alegria e gratidão daqueles que numa sexta-feira, largavam suas gravatas no assoalho do carro, se esqueciam de seus celulares, se derretiam ao sabor do romance e sentavam-se ali, em cada uma daquelas cadeiras desconfortáveis e amarelas.

Karen Santana <ka.santanas@gmail.com>

Comentários

  1. Aos 100 anos de Nelson Rodrigues um belo trecho rodriguiano: "Rei do joelho, era este o nome do estabelecimento. Famoso entre os que conheciam. Inexistente entre os que eram indiferentes. Mas vivo numa personalidade própria. Comia-se o joelho e a alma do porco! Magnífico."



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