O homem que sabia javanês


MF é a alcunha do nosso onírico personagem. O referido persona é daqueles que habitam o imaginário poético dos botequins. Uma lenda viva! MF é a materialização do "homem que sabia javanês", notável conto do Lima Barreto.

PhD em prosódia, MF brincava sorrateiramente com as palavras. Tresloucado, tinha sempre um personagem oculto, pronto para entrar em ação.

MF foi meu contemporâneo na faculdade. Exímio pianista, o nosso personagem quixotesco, era figurinha carimbada da Unesp de Marília. Na Avenida Sampaio Vidal da imaginação, MF conduzia o veículo dos devaneios com maestria.

Nos botecos da vida se intitulava médico, músico, professor, advogado, bibliotecário e outra infinidade de categorias profissionais. Nem a famosa CBO, a classificação brasileira de ocupações, tem catalogada tantas profissões, como as assumidas pelo nosso "Chapeleiro Louco", de Alice no país das maravilhas.   

"Os Daltons estão chegando" era uma de suas expressões usuais. Segundo MF, os Daltons eram irmãos que viviam na zona rural de Urupês. Quando iam para cidade, aos sábados, tomavam vários rabos-de-galo e transformavam a pacata Urupês, em um bang-bang à italiana. Nem Monteiro Lobato para imaginar o tamanho do estrago feito pelos intrépidos e selvagens Daltons. Quando fazíamos nossas incursões etílicas no Bar do Kanashiro, MF sempre dizia: quando o Eduardo, o nosso querido samurai dos trópicos, nos vê chegando, ele deve pensar "ferrou, os Daltons estão chegando".

Com alguns més na cabeça, como dizia o grande filósofo-comediante Mussum, MF saia falando árabe nos bares. Era uma fusão de javanês com tupi-guarani. Já dizia Stanislaw Ponte Preta, um samba do crioulo doido. Era um dialeto que ele mesmo criou e denominou de árabe, "na sua mais completa tradução". Uma certa ocasião numa peleja com uma libanesa, MF começou filosofar no seu intraduzível idioma. A meiga poliana desatou a chorar e questionar a educação recebida dos pais, pois era uma libanesa legitima e, não dominava como o mestre, a língua materna. Ora bolas, quem em sã consciência entenderia aquele ó do borogodó.

Em 1996 os versos, "certas noites eu sou só do samba, eu sou da orgia", tornaram-se peças do passado e daquele momento em diante eram "página virada, descartada do seu folhetim". Casou-se com uma psicóloga. As más línguas sustentam, que a encantável freudiana foi seduzida pelo seu indecifrável objeto de estudo. Como no enigma da esfinge, decifra-me ou devoro-te.

O espaço é deveras curto para descrever as peripécias do nosso Rabelais urupeense em sua epopéia mariliense. Uma crônica é uma gota d'água perto do oceano criativo chamado MF.

Saudades arretada desse cabra da peste e como bem expressou Odair José, na sua cortante melodia brega:
Cadê você?
Que nunca mais apareceu aqui
Que não voltou pra me fazer sorrir
Que nem ligou
Cadê você?
Que nunca mais apareceu aqui
Que não voltou pra me fazer sorrir
Então, cadê você

Por onde andará MF?
 

Comentários

  1. MF declarou o dia da pendura, o professor de musicoterapia da USP virou amigo da polícia e saiu como herói... Nos orientou em um projeto, pois era especialista em Braille... capotou o caminhão da J.Mafuz e sofreu apenas arranhões. Como diria o malvado, MF não dá nó em pingo d'água, faz voltar de marcha ré. Quem não lembra do golpinho do cassulet??

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  2. Qual será as novas de MF, que desaparece e quando aparece vem mais um conto fabuloso.

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    1. Bete me recordo quando MF sofreu "supostamente" um grande acidente. Ele agradeceu ter sobrevivido, mas lamentava pela perda de um grande amigo, o que infelizmente aconteceu, segundo MF. MF disse que estava bem lesionado na perna e com diversos hematomas na mesma. Fomos para um churrasco e depois de 3 dias de festa, MF colocou uma bermuda e esqueceu dos simbólicos "hematomas".

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    2. Já teve uma doença grave no coração, me deixou penssndo nos últimos dias de vida que ele falava que tinha... em 1993.

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    3. nesse dia eu estava na faculdade e a notícia era que ele tinha sofrido um acidente e tinha sido removido em coma induzida... chegamos quase a conseguir uma kombi pra levar o povo da Unesp pra visitá-lo. Até na polícia rodoviária a secretária da faculdade ligou!!! Nada de informações. Fomos na casa dele pra ver se o cabra estava bem e, pra nossa surpresa, nos recebeu com uma caneca de cerveja... a churrasqueira já estava acesa e daí pra frente caímos na música árabe!!! Pontos nas pernas?!!Que nada... Foram três dias de churras e muita risada!! Grande figura!!
      Junior

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  3. Lembro dele tocando piano na aula inaugural, quando entrei na faculdade. Inocentemente pensei: nossa, este cara deve ter uma postura conservadora e prega a moral e os bons princípios pelos corredores da faculdade. Que bom que eu estava errada, ou, que perdi a inocência!

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  4. Gustavo.
    Adorei o blog. Temos um escritor pertinho e oculto. É necessário fazer uma exposição de contos. Publicar um livro, ou... sei lá.
    Vamos pensar em colocar o nome de Gustavo Barreto diante dos holofotes. Bem, o nome de escritor vc já tem!
    Abraços.
    Cassia.

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  5. Gustavo lá vai uma sugestão: Sobre a foto da galera no Bar, mude a cor das letras do texto (Papo, petisco e pinga: Um passeio
    etílico-gastronômico-literário pelo universo infindável dos
    botequins.), pois como está dificulta a leitura. Do mais o blog tá da hora.

    Um abraço.

    Negão
    agmadela@gmail.com

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  6. ..eu que ja viagei por tantos lugares nesse mundo .aquela foi e é a viagem mais longa da minha vida ..embarquei com ele a destino de Ilha solteira ,o percurso que dura uma hora e meia ,demorou mais de 56 só na ida ,foram tantos labirintos ,bifurcações e incruzilhadas ,que depois de tudo que andei é quase nada perto dessa viagem que até hoje sinceramente acho que não voltei...

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