Por que não me ufano


"Há quem diga que eu dormi de touca/que eu perdi a boca, que eu fugi da briga, que eu caí do galho e que não vi saída/que eu morri de medo quando o pau quebrou".

Caro Sérgio Sampaio, pois é, meu velho, todo mundo botou o bloco na rua.

Foi bonita a festa, pá, fiquei contente, só que agora tenho aqui comigo, os meus pasmos botões a me inquietar.

Um meteorito, em formato de pontos de interrogação, avança em minha direção, sem piedade desse reles cronista.

"A nossa pátria mãe tão distraída, sem perceber que era subtraída, em tenebrosas transações", enfim despertou?

Será, cara pálida? Fiquei efusivo com as manifestações. Um ardor vivaz. A alma encantadora das ruas, como o belo título do livro homônimo, me seduz. Salve João do Rio!

Sou um entusiasta das ruas e das suas manifestações. Não discorrerei sobre as minhas participações em manifestações populares. Vade retro, curriculum vitae! Não preciso disso. Aprendi desde criança a gingar na rua. Basta me procurar pelos botequins da vida.

Não preciso repetir o clichê mais gasto, que o solado dos meus pobres sapatos, que onde há fumaça, há fogo.

Basta ver Pondé, Jabor, Folha de São Paulo e outros arautos da direita se manifestarem. Sou gato escaldado.

Ontem vi um misto de clima de jogo no Brasil em Copa do Mundo, com dois dedos de Virada Cultural paulistana e uma pitada do Movimento Cansei.

As brumas da suspeição me tiraram a visibilidade. Conjecturas na mesa do bar. Do arrebatamento inicial ao ceticismo cabal.

A minha bandeira é "anarquia é utopia, faça uma todo dia", mas sem desvios à direita, caro ufanista.

Não me venha com mão no ombro e tapinha nas costas. As minhas costas já estão largas. São anos de senzala, enquanto você desfrutava o banquete da casa-grande.

Onde você estava, no início do ano passado, quando milhares de pessoas foram despejadas, como animais do Pinheirinho?

Agora que o gigante acordou?

Será que é a parte que cabe a eles nesse latifúndio?

"Agonia que sobrevivem, em meia zona e covardias, periferias, vielas e cortiços".

Você que me acusa de governista, digo apenas que "é um elogio, pra quem vive na guerra, a paz nunca existiu, no clima quente, a minha gente soa frio".
Não contem comigo, pois os credores não hesitam, a fatura chegará.

"Eu, por mim, queria isso e aquilo, um quilo mais daquilo, um grilo menos nisso, é disso que eu preciso ou não é nada disso, eu quero todo mundo nesse carnaval", menos a burguesia.

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Comentários

  1. Que delícia de texto! Ficam melhores a cada dia! Mesmo com algumas diferenças queria saber como um amigo anarquista estaria pensando. Abração!

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  2. É isso aí, caro boêmio! http://blogzaz.wordpress.com/2013/06/23/um-caminho-viavel-desistir-sem-desistir/

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  3. Quando o Movimento Passe Livre anunciou que não iria mais chamar mobilizações, uma vez que sua pauta inicial de reivindicações fora conquistada, pensei: FAZ CERTO!!!

    É preciso dar objetividade à grandiosa mobilização realizada e ter clareza no que se quer obter. Todas as demais reivindicações postas à rua são legítimas, mas sem saber operacionalizá-las corre-se o risco de conduzir vontades e indignações ao vazio ou, pior, aos desejos de turba.

    Questionar a corrupção é imprescindível, mas o que se propõe para controlá-la e puni-la?
    Querer melhores hospitais e escolas é fundamental, mas como tornar isso realidade?

    É preciso mais que a voz nas ruas: é preciso projeto político e caminhos para institucionalizar essas vozes.

    Dentre os desafios colocados estão a busca por novos modelos de ação política, que horizontalizem as direções, mas que tenham sim direção. Questionar o sistema representativo e a necessidade de lideranças verticalizadas é uma marca dos movimentos surgidos em todo o mundo nos últimos anos. Porém, é preciso pontuar caminhos que não se esvaziem no discurso generalizado de que ninguém nos representa, caso contrário, fecha-se o Congresso, destitui-se os Poderes e caímos num falso anarquismo, ou seja, na balbúrdia.

    "Os movimentos totalitários são possíveis onde quer que existam massas que por um motivo ou outro, desenvolveram certo gosto pela organização política. As massas não se unem pela consciência de um interesse comum e falta-lhes aquela específica articulação de classes que se expressa em objetivos determinados, limitados e atingíveis. O termo massa só se aplica quando lidamos com pessoas que, simplesmente devido ao seu número, ou à sua indiferença, ou a uma mistura de ambos, não se podem integrar numa organização baseada no interesse comum, seja partido político, organização profissional ou sindicato de trabalhadores" - Hannah Arendt, As origens do totalitarismo.

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  4. Boa crônica Gustavo...No Brasil não há grandes incêndios, e sim uma fogueirinha aqui e acolá, e sempre temos nossos (caros) veículos de comunicação que sabem criar uma combustão e depois apagá-la como lhes convém...O Brasil é assim....

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