Bip-Bip


Caros proudhonianos, sejam bem-vindos ao sui generis Bip-Bip.

O espaço extrapola o conceito clássico de botequim. O reduzido mosaico compreende bar, espaço cultural y otras cositas más.

No dia do juízo final, se porventura exigissem a classificação do local, arriscaria defini-lo como núcleo de resistência.

São "44 anos a serviço do porre e da amizade"; eis o dizeres no frontispício do bar. Cabe um adendo ao portal: e também da música de qualidade.

Sem delongas, convoluto cronista -- sussurra Alfredinho, visivelmente irritado e sem paciência com a minha procrastinada fala.

Alfredinho é o proprietário dessa maravilha de cenário. O Bip-Bip está situado no coração de Copacabana, desde o fatídico dia 13 de dezembro de 1968.

A ironia de destino, ou grande paradoxo da história, é que o botequim cresceu e se desenvolveu no avesso do avesso do avesso do avesso.

Um legítimo pé na bunda da ditadura militar.

Chamem o síndico Tim Maia e esqueçam o espectro do garçom ou coisa do gênero.

Aqui é autogestão! És vero, caros proudhonianos.

Cada um pega a sua bebida e só depois marca ou paga, se quiser, com o Alfredinho.

Cabe um parêntese aqui. Serve para retratar o humor do nosso grande personagem Alfredinho. É um trecho hilário do livro "Botequim de bêbado tem dono", do Moacyr Luz.

O fragmento retrata a chegada de um casal de turistas ao local:

"- É aqui o Bar Bip-Bip?
- Leu a placa?
- Ah, sim, é verdade. O senhor poderia servir dois chopes?
- Aqui não se trabalha com chope, só cerveja.
- Desculpa-me, então uma cerveja, por favor.
- Olha, a cerveja aqui é pequena. Pra vocês, é melhor pedir duas.
- Sim, sim, claro! Duas cervejas!
- Meu amigo, nós aqui não temos garçom. Vai lá dentro, abre o freezer, pega as bebidas e, depois, na prancheta ao lado, você anota o seu nome e faz uns risquinhos com a quantidade.
Catatônico, o turista segue em direção à geladeira e ainda ouve a última frase do nosso anfitrião:
- Aproveita e mata essa baratinha que está passando".

O maestro fica numa mesa, logo à entrada do bar, exatamente na calçada.

Em cima do móvel dispõe de inusitadas tigelas. São três utensílios que fazem o papel de caixa.

As moedas ficam armazenadas na tigela de cima. Notas medianas, na tigela do meio. As graúdas, na de baixo.

As anotações são feitas em papéis de pão e as porções seguem no mesmo padrão autogestionário.

Retira a embalagem no frigobar, esquenta no microondas e pede para o Alfredinho anotar.

Se não for incomodar, uma lavada no prato, pós-refeição, é bem-vinda.

Os músicos tocam por amor à arte. Não existe couvert. E o mais interessante: finda a música, o estalar de dedos substitui o clássico aplauso. 

Segundo matéria da Carta Capital, de 05/07/2013, o "estranho nome Bip Bip foi dado em 68 pelos fundadores, que admiravam os primeiros foguetes russos daquela época, mas sem querer atribuir conotação política alguma, como algum malicioso poderia suspeitar. Era só o fascínio pela conquista do espaço, a velocidade: daí o onomatopaico Bip Bip, nome que contradiz o estilo e os ritmos da casa de hoje, lentos e serenos".

Se o Bip-Bip dos foguetes russos esvaíram-se, o nosso Bip-Bip resiste heroicamente, com muito charme e simpatia.





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