Cabisbaixo, ele se moveu até a mesa de fórmica. Eram quinze horas e a notícia sobre a demissão o deixou atordoado.
Como faria agora? – pensava obstinadamente. Eram
nada mais, nada menos, cinco pessoas que dependiam do seu salário.
O traje social destoava-se dos habitués do
botequim. Desocupados, taxistas famintos, prostitutas decrépitas e pífios
punguistas ocupavam felinamente o carcomido espaço.
Puxou com veemência a camisa para fora da calça. Um
astuto senhor assustou-se, temendo logo uma peixeira.
O tecido amarfanhado do linho desabrochou como uma
rosa. Daquelas que esquecemos num livro e nos deparamos tempos depois. Aquelas
que insistem em lutar contra o tempo, como se fossem etéreas.
Desligou o celular e pediu para o garçom uma
cerveja. Explicaria tudo em casa. Deveras difícil pontificar a situação por
telefone.
O garçom colocou a cerveja na mesa e saiu lépido ao
encontro de outro freguês.
Ele mais que depressa encheu o copo e o moveu até a
boca. O líquido estalou na língua. Crepitou diversas vezes de prazer.
Ricocheteou. Fluiu torrencialmente pelo esôfago. Os pelos delgados eriçaram-se.
O sistema digestivo arrebatado transcendeu. O regozijo foi pleno.
Às favas o mercado de trabalho. Como um
bom hedonista, o que valia era o prazer imediato.
"Amanhã há de ser outro dia",
cantarolou, batucando numa caixa de fósforos.
Engatou um novo verso: "não quero nem
sabê, não quero nem sabá, eu quero é rosetá".
Riu sem medo do ridículo. Riu sem esperar o veredito de um chefe. Riu sem protocolos.
"Enfim, cada um o que quer aprova, o
senhor sabe: pão ou pães, é questão de opiniães..."
Curtam no Facebook a nossa Fan Page:
Comentários
Postar um comentário