Eleonora
Eleonora continuou obstinadamente a procura pela mãe. Uma questão de
honra encontrá-la. A sua ausência era atordoante. Eleonora arrumara trabalho de
diarista em vários apartamentos. Tinha um horário mais flexível e, além de
tudo, esquivara-se das humilhações constantes impostas pelos antigos patrões.
Aos poucos a vida ia se acertando, como um relógio que desanda a parar,
mas que gradativamente vai reconquistando o ritmo.
O que a inquietava era dividir o apartamento com a irmã e o cunhado. Foi
recebida com pompas de chefe de Estado. Não passou, por hipótese alguma,
necessidade. Contudo, a situação deixava-a constrangida. O espaço era exíguo.
Encontraria a mãe e alugaria um lugar para elas. Refutou a ideia da irmã de
lutar por uma moradia. Acreditava na causa da luta da irmã, mas carecia da
verve de uma militante.
A causa não é minha, Eleonora. A causa é de todos nós – tentou argumentar
Jurema. Parece que você foi cooptada pela burguesia. Como o Paulo Freire dizia,
“é a voz do opressor na boca do oprimido” – insistiu a irmã.
Eleonora, incólume, ouvia. Não tinha aversão ao movimento, nem sabia quem
era aquele Paulo. Entendia a legitimidade da causa, mas achava que aquelas
ideias não a pertenciam. Subjugada pelo sistema, nas palavras da irmã
militante.
Eleonora só queria rever a mãe e alugar um quarto. Só isso, nada além
disso. Desconstruiu na cadência existencial o significado dos sonhos. Fustigada
por uma realidade mutilante, desaprendeu a sonhar.
Com o tempo, foi ficando mal vista pelo movimento, pois não participava
dos atos coletivos, das assembleias. A liderança, pressionada pelos moradores,
exigiu a saída de Eleonora da ocupação.
Jurema previra o desfecho. Mais dias, menos dias, iriam contestar a
omissão de Eleonora.
É uma alienada, diziam.
Eleonora era sim, uma rosa, que não desabrochou. Uma rosa que nasce cercada por adversidades e demora a compreender a grandeza da sua existência.
Eleonora era sim, uma rosa, que não desabrochou. Uma rosa que nasce cercada por adversidades e demora a compreender a grandeza da sua existência.
Comentários
Postar um comentário